terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Um estouro na estrada


Um estouro na estrada
Nubor Orlando Facure


Os causos que conto são verdadeiros e acontecidos, outros inventados. Para alguns pedaços preciso pedir à Deus para dar o devido desconto quando cometo omissão ou exagero.
Mais esse é um que merece registro:
Deve ter sido 1976, convidamos o Professor Lefevre para uma palestra aqui em Campinas – uma aula especial no anfiteatro da antiga e carcomida Santa Casa – o famoso “Paulistão“,  sujo e sem qualquer conforto – mas, cheio de histórias daquelas aulas magistrais das Teses de Doutorado no início da Faculdade de Medicina – galhardamente, eram um espetáculo social.
Desfrutei de aulas, visitas à enfermaria e reuniões de casos no HC em São Paulo na década de 60 no tempo do Professor Lefevre – fundador inconteste da Neuropediatria brasileira – fez história nessa área e até hoje ninguém se aproximou aos sues méritos e genialidade.
Era uma figura vistosa, imponente, para aparecer em qualquer das epopeias do cinema de então – de perto poderia ser  Cesar ou o Poderoso Chefão – mas, seu carisma e sua docilidade, com um jeito particular de falar,  deixava as alunas e assistentes magnetizados – a cada leito que parávamos para que ele revelasse ali suas opiniões havia um séquito de fiéis seguidoras – não era bajulação, ele não se dava a isso, era deslumbramento.
Finalzinho da manhã, encostávamos ao seu lado no corredor e o discurso político de esquerda se revelava num homem comprometido com um ideal socialista romântico – a esquerda filosófica da USP naquela ocasião

Quando vim para Campinas dei algumas aulas de neuropediatria complementadas com um filme clássico em que o Professor Lefevre expunha as técnicas de exame neurológico do recém nascido – ano após ano esse filme era exibido nas diversas turmas que passavam pela neurologia – a modernidade trouxe avanços mas não a mesma competência do Professor Lefevre em lidar com suas próprias mão o corpinho delicado dos bebês – talvez, como tudo que envelhece, as gerações de novos neurologistas nem sabem mais onde estará essa relíquia cinematográfica – pobre pais que se desfaz da experiência dos professore/médicos de antigamente

Assim que o Professor Lefevre chega a Campinas recebo um telefonema – era o Professor Spina-França, famoso pela sua rigidez germânica – queria me dar um recado particular – Professor Nubor, está em suas mão um Homem, o professor Lefevre, a quem Você deve dar toda proteção possível, não me deixe acontecer nada com ele – mil coisas se passaram na minha cabeça, o coração batendo fora do peito, as pernas desapegaram do chão, não tenho memória para lembrar sequer o título da aula – era 1976, isso diz quase tudo, e, na época trabalhava conosco o Dr. Moreira fazendo nossos eletroencefalogramas – o convoquei e pedi às preças a presença da minha esposa (nossa enfermeira na ocasião) – terminada a aula, instalamos o Professor, que mantinha sua cândida calma, no meu Galaxi LTD marrom e fomos os quatro para São Paulo. Na altura de Louveira escuto um estrondo – o Dr. Moreira disse: estourou um pneu – até hoje furar pneu nunca mais me aconteceu na vida – mas, com o Professor Levevre recomendado veementemente pelo Prof Spina, tinha de acontecer. Não adiantou termos prometido lhe darmos o máximo de proteção, foi o acaso ? justamente na Anhanguera ? – naquele tempo só passava por ali um gato pingado de vez em quando. Jamais teria forças até para sair do carro, mas, providencialmente agradeço ao Dr. Moreira até hoje – ele fez a troca e entregamos o Prof. Lefevre são e salvo – esse homem brilhante veio a falecer anos mais tarde de complicações bobas numa cirurgia cardíaca de onde milhares saem ilesos (sic)


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